O GENIOSO MACACO PREGO




 Se depender do intrometido Cebus apella o aumento na lista das espécies "cultas" vai ser só a primeira das revoluções. Estudar como e por que o macaco desenvolveu seus talentos pode também ajudar a entender em que circunstâncias a inteligência avançada, a tecnologia e a cultura aparecem numa espécie.


Quase dá para ouvir os acordes de Assim Falou Zaratustra, da trilha sonora do filme 2001: Uma Odisséia no Espaço, quando se olha para o jovem macaco-prego da foto à esquerda, prestes a esmigalhar um coquinho com a ajuda de uma pedra quase tão pesada quanto ele. Tanto no filme quanto na cena flagrada no cerrado do Piauí, um primata descobre o poder surpreendente que o uso de uma ferramenta confere, mas as semelhanças param por aí. Afinal de contas, os macacões do diretor Stanley Kubrick são supostas representações de ancestrais diretos do homem moderno, enquanto os macacos-prego (chamados pelos cientistas de Cebus apella) não passam de meros primatas do Novo Mundo, separados da nossa linhagem lá se vão 40 milhões de anos. Aprender a usar ferramentas não está na lista das habilidades que se esperam deles.

Acontece que as expectativas a esse respeito estão sendo demolidas a cada golpe dos "martelos" de pedra dos pregos, como os íntimos costumam apelidar esses animais. O uso de ferramentas pode ser apenas a ponta do iceberg de uma série de verdadeiras tradições culturais símias, como as que os cientistas já identificaram entre os chimpanzés (Pan troglodytes) e os orangotangos (Pongo pygmaeus). Essas são as únicas espécies do planeta além da nossa que podem se gabar dessa capacidade até agora. Se depender do intrometido C. apella, no entanto, o aumento na lista das espécies "cultas" vai ser só a primeira das revoluções. Estudar como e por que o macaco desenvolveu seus talentos pode também ajudar a entender em que circunstâncias a inteligência avançada, a tecnologia e a cultura aparecem numa espécie.

Essa é a possibilidade que anda empolgando o etologista (especialista em comportamento animal) Eduardo Ottoni e seus colegas do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo. Desde 2001, quando a equipe publicou seu primeiro trabalho sobre o tema numa revista científica internacional, dados cada vez mais consistentes vêm sendo revelados sobre o uso de ferramentas e outras possíveis tradições culturais entre os pregos. As primeiras observações aconteceram num grupo que vive em semiliberdade no Parque Ecológico do Tietê, em São Paulo, mas já está claro que macacos totalmente selvagens também desenvolvem a técnica. A equipe já deu de cara com as sessões de quebra-nozes em duas regiões diferentes do Piauí: o Parque Nacional Serra da Capivara, famoso pela arte rupestre pré-histórica, e o município de Gilbués, no extremo sul do estado.


Fonte para saber mais: scientific american brasil